(Desculpem a qualidade da marca e do selo mas é a único que tenho)
Luís Frazão em "Contribuição para a História Potal do Baixo Zambeze" (Maio 2008 - Campo das Letras Editores) procura dar uma resposta à pergunta, corrigindo o proposto no artigo "Tentativa de identificação de uma marca muda da Zambézia" publicado no Jornal de Filatelia n. 59 de Março de 2000. No livro, e se entendi bem, Frazão descarta as hipóteses do o carimbo ter sido utilizado primeiramente em Sena e depois em Mutarara ou em Maquival.
Não sei quais as razões pela qual Frazão descartou estas hipóteses mas também teria estranhado que tanto em Sena como em Mutarara não estivesse em uso, na maior parte dos anos abrangidos pelo uso do carimbo de barras (conhecido batido em selos de 10/6/1888 a 31/10/1903), o carimbo privativo.
É de facto igualmente improvável que o carimbo pertencesse à estação postal de Maquival uma vez que aparece citada pela primeira vez em 1899 na tabela publicada pela Direcção dos Correios e Telégrafos da Zambézia e Chire no Boletim Oficial de Moçambique (BOM) com o título "Serviço combinado para a permutação da correspondência entre todos os correios da Zambézia, por via terrestre" (ver pag. 137) sem contar que Maquival pertencia ao 3° ramal (não publicado no livro) que juntava Quelimane a Pebane (rota estranha ao Rio Zambeze).
Em contrapartida Luís Frazão põe a hipótese a possibilidade de esta marca ser da Afrikan Lakes Ca, "aplicada a bordo ou nos entrepostos da companhia situados ao longo do rio e na correspondência avulsa que lhes era confiada" (ver pag. 146).
A sustento desta hipótese o autor fornece estes argumentos (ver pag. 146):
1 Em 1889 a Afrikan Lakes possuía os dois únicos vapores mercantes navegando no Zambeze e no Chire
2 O postmaster de Chiromo em 1891 determinava claramente que a entrega de cartas avulsas deveria ser feita aos comandantes dos vapores da Afrikan Lakes, que desembarcavam as cartas em Vicente/Mopeia para serem encaminhadas ao vice-cônsul em Quelimane.
3 Os correios de Quelimane não multavam as cartas que vinham com os selos já inutilizados, facto possível só com o conhecimento e assentimento prévio de Quelimane.
4 A última data de aplicação conhecida do carimbo mudo é de 31 de Outubro de 1903. Coincidentemente uma carta transportada pela Afrikan Lakes em Março 1904 já não apresenta esta marca e os selos da carta foram obliterados em Chinde em 7 Março 1904.
O argumento 1 está ao meu ver parcialmente correcto. A Afrikan Lakes possuía os dois únicos vapores (Lady Nyassa e John Moir) navegando no Zambeze e no Chire, mas em 1878! (ver pag. 119) Pode ser que a diferença esteja na tipo de vapores, porque se é verdade que os Lady Nyassa e John Moir eram os únicos vapores mercantes em 1889, assim como descrito por João Azevedo Coutinho (ver pag. 120), é também verdade que em 1889 eram operativos quatro vapores da Esquadrilha do Zambeze (ver pag. 121) muito provavelmente também autorizados desde então a transportar correspondência (em 1893 estavam certamente autorizados assim como se pode ler na carta do Governador do distrito da Zambézia dirigida ao Comandante militar do Chinde (ver pag. 131).
O argumento 2 aparece em The Postal History of Nyassaland de Edward B. Proud (1997):
"There was of course no postal service in 1891 (na Africa Central Britanica), and letters were generally sent through the African Lakes Company to the vice-consul in Quelimane together with the money for postage stamps, and sent them home from the Portuguese Post Office. We commended to establish a postal service in July 1891" (ver pag. 87),
e é reforçado pelas instruções recebida pelo primeiro postmaster em Chiromo, H.C. Marshal, sempre publicadas no livro de Edward B. Proud:
"The letters addressed to any place on the banks of the Shire, or to Vicente, Mopeia or Chinde, you will hand to the captain of the S.S. James Stevenson or Lady Nyassa, or the British steamers proceeding in the direction of the placed mentioned, and request him to deliver the letters for transmission to the local Portuguese postal authorities, or to the person to whom the letters are addressed." (ver pag. 88)
Porém:
"Letters were generally sent through the African Lakes Company to the vice-consul in Quelimane together with the money for postage stamps": ao vice-consul chegavam cartas não franqueadas e portanto não havia selos por obliterar.
Além disso a correspondência que tinha que transitar por Quelimane a partir de Chiromo tinha que ser transportada em malas seladas: "Those which are intended for any part of Portuguese East Africa (except the Shire districts, Vicente, Mopeia or Chinde), that is say for Ibo, Moçambique, Quilimane, Inhambane, Lourenço Marques (Delagoa Bay) or any port or place in Portuguese East Africa, save those mentioned in bracket, you will desptch in a sealed mail-bag addressed to the Director de Correio, Quilimane" (ver pag. 88). Ao director dos correios de Quelimane era portanto enviada uma mala selada. Se tivéssemos de admitir que esta correspondência tinha selos obliterados com o carimbo de barras, deveríamos admitir que o carimbo estava na posse dos correios de Chiromo e que esta estação possuía e utilizava selos de Moçambique/Zambézia, o que parece muito pouco provável.
As cartas destinadas a Vicente, Mopeia ou Chinde "will hand to the captain of the S.S. James Stevenson or Lady Nyassa, or the British steamers proceeding in the direction of the placed mentioned, and request him to deliver the letters for transmission to the local Portuguese postal authorities, or to the person to whom the letters are addressed" ou seja as cartas eram entregue a pessoal dos correios de Vicente, ou Mopeia ou Chinde e destinadas apenas para territórios da Zambézia, como se fosse uma normal permutação de correspondência. A distribuição limitada à Zambézia está em contradição com carta publicada na pag. 145 destinada à Inglaterra.
As cartas destinadas a Vicente, Mopeia ou Chinde "will hand to the captain of the S.S. James Stevenson or Lady Nyassa, or the British steamers proceeding in the direction of the placed mentioned, and request him to deliver the letters for transmission to the local Portuguese postal authorities, or to the person to whom the letters are addressed" ou seja as cartas eram entregue a pessoal dos correios de Vicente, ou Mopeia ou Chinde e destinadas apenas para territórios da Zambézia, como se fosse uma normal permutação de correspondência. A distribuição limitada à Zambézia está em contradição com carta publicada na pag. 145 destinada à Inglaterra.
O resto da correspondência saída de Chiromo era transportada em malas fechadas com destino aos postmasters de Zanzibar ou Durban "but the sealed mail-bag are only to be despatched by British steamer or gunboat". Esta correspondência portanto não transitava pelos correios de Moçambique mesmo se por alguma razão o transporte por ocean-going steamer em Chinde das malas destinadas a Zanzibar podia ser dificultoso. Nesse caso: "you may at your discretion address the bag to H.M. Vice-Consul, Quilimane, with a request that he will kindly forward the mail-bag by safe means to Zanzibar".
O argumento 3 está relacionado com a fotografia publicada na pag. 145. A carta franqueada com selos D.Luis I obliterados com o carimbo de barras com a data 28/5/1896, transitou de facto por Quelimane sem que lhe fosse contestada a legalidade da franquia.
Porém:
que a carta não fosse porteada só demonstra que os Correios de Quelimane conheciam a origem dos selos e da obliteração. Não é uma prova que sustente a hipótese que o carimbo de barra pertencesse à Afrikan Lakes. Além disso a carta em questão apresenta um carimbo de trânsito de Quelimane de 19/9/1896, ou seja com uma data posterior de mais de 3 meses e meio da data de envio. Seria este um ponto a esclarecer melhor.
O argumento 4 deduz-se da carta cuja foto é publicada na pag. 143. A carta "é destinada a Quelimane e, se a inscrição "Via Chinde" tem bo contexto deste estudo um interesse certo, é no entanto a outra inscrição "C/ A L.a", e cuja leitura é "Care of African Lakes", que se torna fundamental" (pag. 142)
Porém:
infelizmente a ilustração é demasiado pequena para apreciar as partes manuscritas. O "C/ A L.a" ,pelo que se pode ver, é duvidoso. Parece haver mais uma letra entre "C/" e "A" e porque o "a" de "L.a" se o "L" estaria por "Lakes"? Se umas letras manuscritas fossem suficientes a atribuir o transporte a um vapor, não se tornaria mais provável atribuir o transporte ao vapor Zambeze cujo nome aparece escrito no verso por baixo dos selos? No relatório de Juvenal Elvas aparece o vapor Zambeze da Companhia da Zambézia como vapor operativo nos finais de 1903 (ver pag. 123).
À luz destas observações considero já pouco provável que o carimbo de barras tenha sido utilizado a bordo dos vapores da Afrikan Lakes ou que estivesse na posse desta companhia (num dos seus entrepostos). Além disso, a pouca probabilidade considero confirmada também pela morfologia e grupo datador do carimbo.
1 Um carimbo de barra pode ter só e uma única utilização plausível: a obliteração de selos. Não é plausível que uma companhia privada e ainda por cima estrangeira efectuasse um serviço próprio dos correios. É aceitável uma autorização para o transporte de correspondência, menos aceitável é uma autorização no tratamento da correspondência incluindo necessariamente, havendo um carimbo obliterador, a venda de selos.
2 Umas fotos tiradas do site www.leiloespdias.pt mostram, mais claramente de quanto o possa fazer o meu selo, como é composta a data do carimbo.
Os meses estão escritos em português e não em inglês como era de esperar se o carimbo tivesse sido encomendado pela Afrikan Lakes ou pelos correios de Chiromo. O carimbo foi mandado fabricar e entregue a uma, por enquanto desconhecida, estação postal pelos correios de Moçambique/Zambezia e para efetcuar operações próprias de uma estação postal, por quanto provisoria possa ter sido.
Ao meu ver o do carimbo de barras continua sendo um mistério mas é provável que haja uma outra hipotese mais sustentável.
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